por Fernando Muniz
O pai se adianta ao filho e apanha o bife maior.
– Mas papai, o que é isso?!
– Isso o quê?
– Pegar assim, o bife maior? – vem à sua mente os jantares da infância, a reza na língua dos ancestrais, incompreensível, a mãe colocando a travessa de bifes e os cinco irmãos em luta pelo maior pedaço, enquanto o pai, na cabeceira, a trovejar sobre a falta de educação, dedo em riste para uma gravura de são Marun, exemplo de retidão e austeridade, a encher a gurizada de remorso.
– Oras!
– Mas não era você que brigava conosco?
O pai olha o garçom a rodopiar entre as mesas daquele restaurante do centro, seu preferido há tanto, hoje decadente. Pensa em pedir alguma coisa, mas desiste. Cofia a barba e mira o filho, com um olhar matreiro, levantino.
– Não sobrou o bife menor para você?
– Sobrou, mas…
– Então?! Não é o que tinha que acontecer? Pega ele! Está esfriando!