Rogério Distéfano
“Criminosos sem dignidade, com finalidade politiqueira, continuam a divulgar absurdas mentiras, tentando vincular meu antigo escritório e meu nome ao PCC”. A declaração do ministro Alexandre Moraes sobre um argumento da campanha contra sua nomeação ao STF. Você, eu, o anônimo da esquina, no bar, em casa, no telefone, pês da vida, podemos falar desse jeito.
Um professor do Largo de São Francisco, autor de obras jurídicas, secretário e ministro de Estado e agora candidato a ministro do STF não pode. Mesmo no auge da indignação. Não é pela indignação, ele tem todo direito a ela. É pela imprecisão, à qual não tem direito, mesmo no auge da indignação. Parece preciosismo, firula, fricote chamar a atenção para as palavras do ministro.
Mas ele não pode falar de “criminosos sem dignidade”. Criminosos, ou seja, gente que cometeu crimes, têm dignidade? Claro que o ministro Moraes não pensa assim, afinal começou com “criminosos”, gente que passou pelo devido processo legal e cumpre a pena. Mas ele tem obrigação de policiar as palavras. Afinal, tudo que escrever no STF terá repercussões importantíssimas.
Nessa hora a gente dá até um desconto para aquela acusação de que o ministro plagiou o jurista espanhol: ficou inseguro com seu texto e garantiu-se no rigor do confrade ibérico. Esses “criminosos sem dignidade” divulgam “absurdas mentiras” contra o “nome” do ministro e seu antigo escritório. Mais uma vez o ministro escorrega no complemento: a mentira é um absurdo por si mesma.
“Absurdas mentiras” – advogado, o ministro põe adjetivo e advérbio antes do substantivo, questão de estilo. Não serei leviano de dizer que ao desqualificar mentiras como absurdas, o ministro acaba por qualificar outras, nem tão mentirosas, ali na fronteira com a verdade. Me pergunto por que sacam mentiras ora contra “o nome”, ora contra o “antigo escritório” do ministro.
Evidente que não foi nada disso, faltou o assessor que limpa o texto, ciente de que escrever é mera consequência do ato de pensar. O ministro deixou-se levar pela emoção. Não pode. Ministro ad nutum, temporário, candidato a ministro vitalício, obrigado à precisão no que fala e escreve, não deve tropeçar na língua e na pena – ou no editor de texto, que seja.