por Fernando Muniz
O rapaz não tem dinheiro. Nem bens nem nada que valha ou preste. Menino de alma leve que largou o interior para ser feliz na cidade grande, conseguiu apenas ficar dias sem comer, umas cicatrizes no rosto e costelas quebradas, por apanhar de quem não tolera meninos que gostem de meninos.
Segundo mês seguido de aluguel em atraso. A dona do apartamento, na verdade do prédio inteiro, um cortiço no centro da cidade, não perdoa. Surge pelo corredor com sua bengala de aço, em passos lentos, aproximando-se da porta.
Bate uma vez; duas, três. Aguarda mais um pouco e retorna, mais forte. Quer o aluguel, ou qualquer coisa em seu lugar, não importa o quê, não importa como. Avareza é droga potente, seu hálito frio sussurra que o fim não chegará enquanto ela coletar o quanto puder, até quando puder.
O rapaz abre a porta; implora, desanda a chorar. Mostra o apartamento, vazio. A senhoria não quer saber. Avisa que o porteiro e seus parceiros irão procurá-lo mais tarde. E não toleram meninos feito ele.