20:00ZÉ DA SILVA

A revolta do frango assado aconteceu de verdade, apesar de não ter sido registrada em livros de história. Foi num bairro de subúrbio, boteco quase sujinho, mas bom para quem gosta de tomar uma lisa antes de ir pra casa enfrentar o ambiente no fim de mais um dia de trabalho. O negócio ia mal. O dono resolveu instalar uma máquina de assar, aquelas com espetos giratórios, a fim de faturar mais algum no domingo sagrado. Fez – e a coisa até que engrenou. Mas… coitado dos frangos! Além de expostos, nus, ainda se sentiam humilhados com aquele aço atravessando o corpo desde o furo sob a sambiquira, saindo lá na frente onde a cabeça, cadê? já tinha ficado pelos descaminhos da vida indigna iniciada numa granja/campo de concentração. Ali a ex-penosa era assada na base do carvão. Foi num domingo cedo que os corpos do bichos, embebidos no líquido de tempero que tomava conta de uma bacia, se concentraram para que algo acontecesse. E aconteceu! O dono da birosca colocou o carvão na máquina, embebeu tudo com álcool, ateou fogo e, para adiantar o expediente, quis aumentar as chamas. O fogo fez uma ponte incandescente do carvão à garrafa plástica – e houve a explosão. Um grito de pavor se ouviu. Alguém jura que, junto, escutou um coro cacarejante e feliz. Dali nunca mais se viu o espetáculo dos corpos girando até ficarem dourados. Os cachorros reclamaram. A máquina sumiu. A vida continuou.

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