por Ruy Castro
Há uma nova expressão no ar: “sistema de freios e contrapesos”. Vem da física, mas tem sido usada nos EUA para definir um complexo de entraves dentro do governo americano que impedem que um presidente, por mais estabanado, possa tomar decisões desastrosas. Ao ouvi-la, imagino uma engrenagem de rodas dentadas, porcas e arruelas gigantes, como a que engoliu Carlitos em “Tempos Modernos” (1936), e onde talvez se esconda a famosa e jamais vista rebimboca da parafuseta.
É o que tem servido de consolo para os americanos que nunca pensaram ter na Presidência um macaco em loja de louças como Donald Trump. Se, de repente, ele decretar que todos os cidadãos serão obrigados a usar a cueca por cima das calças, como o Super-Homem, ou que o Alasca seja devolvido aos esquimós e façam bom proveito, isso não será possível. Há mecanismos que barram ou dificultam esses surtos de expediência.
Mas, pelo tipo de auxiliares que tem nomeado para funções-chave em seu governo, Trump parece disposto a encarar e neutralizar os ditos freios e contrapesos. Seu ministro do Ambiente vê grande exagero nas denúncias sobre o aquecimento global. A responsável pelos parques nacionais e reservas indígenas é a favor de abrir esses espaços para as companhias de gás, petróleo e mineração. O futuro ministro do Trabalho é dono de uma cadeia de fast food e acha que seus empregados não precisam receber por horas extras.
Já o da Justiça quer acabar com a imigração e adora a ideia do muro na fronteira com o México. O da Defesa é um general reformado que, mesmo de pijama, fazia jus ao apelido de “Cachorro Louco”. E seu embaixador em Israel é um homem sem experiência diplomática num dos postos mais explosivos do mundo.
Será uma batalha e tanto: Trump contra os freios e contrapesos. E quem levará a breca somos nós.
*Publicado na Folha de S.Paulo