Ela está na sacada de um sobrado. Olhava para a rua, na ponta dos pés, quando pedi para virar pra mim. Clique. Uma imagem que atravessará os anos. A menina devia ter uns três anos. O vestidinho estampado era cinturado. O rostinho redondo, moreno, realça o sorriso com dentes bem pequenos. Mas é nos olhos dela que agora, três décadas depois, eu embarco. E consigo ler o que diziam, porque ali eu já estava no início do caminho da perdição e ela me revelava que iria esperar o fim da tormenta para a gente poder conversar. Eu atrás da máquina, olho no visor, com a mente, a alma e o corpo já no universo paralelo, sem me dar conta, guardei aquilo para que tudo se revelasse agora, quando achei a fotografia sem querer. Ela me esperou e sofreu. Eu sofri e esperei. Nos encontramos há algum tempo para conversarmos sobre nossas dores, delírios e alegrias da caminhada. Ela lá, eu aqui, mas juntos. Minha menina negra. Minha poeta. Meu amor.