por Clóvis Rossi
Desde o governo Fernando Henrique Cardoso, mas com muito mais intensidade no período Lula, a máquina oficial de propaganda vendeu a lenda de que a desigualdade no Brasil se reduzira substancialmente.
Mentira, conforme já escrevi um punhado de vezes nos meus diferentes espaços nesta Folha, mas uma mentira comprada mecânica e acriticamente pela maioria absoluta dos jornalistas, até por alguns muito competentes.
Nem quando surgiu um fundamentado estudo de técnicos do Ipea (Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas) demonstrando a falácia, houve uma retratação à altura.
Agora, aparece novo estudo que informa, corretamente, que a taxa de redução da desigualdade no Brasil permaneceu estável entre os anos 2000 e 2014, exatamente o período em que mais se propagou a lenda.
O estudo é do PNUD (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento) e mostra que, apesar do crescimento da renda das pessoas mais vulneráveis e extremamente pobres, o Brasil não conseguiu, em 14 anos, diminuir o fosso entre ricos e pobres. Colaboraram no estudo o já citado Ipea e a Fundação João Pinheiro.
O que melhorou –assim mesmo de forma “inexpressiva”– foi o índice de Gini, mas este mede apenas a diferença entre salários, que não é a principal fonte de desigualdade.
O que a torna obscena é a disparidade entre o rendimento do capital e o do trabalho, mas medi-la exige pesquisas muito mais abrangentes e sofisticadas do que a Pesquisa Nacional por Amostragem de Domicílios, fonte de referência do índice de Gini.
No mesmo dia em que era divulgado o estudo sobre a desigualdade de três respeitáveis fontes, apareceu também uma pesquisa que talvez explique porque a desigualdade é uma chaga permanente na pele do Brasil.
Trata-se de um dos países menos preocupados com a pobreza e a desigualdade social, como mostra a edição mais recente da pesquisa “What Worries the World” (O que preocupa o mundo), realizada pela Ipsos em 25 países entre 23 de setembro e 7 de outubro.
A Ipsos é uma empresa de pesquisa presente em 87 países.
De acordo com o levantamento, apenas 21% dos pesquisados no Brasil citaram as duas questões como sua maior preocupação, o que coloca o país em penúltimo lugar nesse quesito entre as 25 nações pesquisadas, somente à frente dos Estados Unidos (19%).
Se os brasileiros não estão incomodados com essa chaga permanente, não há, em consequência, pressão social para cicatrizá-la ou, ao menos, para reduzi-la.
Até entendo que questões mais presentes no noticiário e no dia-a-dia ocupem a mente dos brasileiros. Exemplo: a corrupção é o maior problema citado, mencionada por 48% dos pesquisados. Em tempos de Lava Jato, nada mais compreensível.
Empatada com a corrupção vem a saúde (48%), uma vergonha nacional, e depois a violência (45%).
É compreensível, mas não justificável. Afinal, “uma sociedade desigual é uma sociedade doente”, dizem técnicos do Ipea e do PNUD à Agência Brasil. Muito doente.
*Publicado na Folha de S.Paulo
e bom mesmo era o pestismo, vivemos no céu durante 13,5 anos e não nos demos conta disto. Agora que o sono acabou e acordamos para a realidade, nos demos conta que vivíamos numa enganação só. Pior para nós, os que ficaram de olhos bem abertos nestes anos todos, ou seja, os donos da grana e do Poder, encheram os seus bolsos, aí a diferença entre eles e a maioria de nós só aumentou.