Artigo do juiz federal Roberto Wanderley Nogueira, do Recife, publicado no blog do jornalista Frederico Vasconcelos
Abaixo as distorções – não raro gritantes – da política de remuneração no serviço público em geral!
Auxílio-moradia tal como concedido aos magistrados é um tipo de aumento disfarçado com exclusão dos inativos. Envergonha mais e divide mais a categoria do que propriamente a felicita.
Pela volta do Adicional por Tempo de Serviço (ATS), ou seu correlato, e da justiça remuneratória para todos!
Sobre isto, foi justamente o Supremo Tribunal Federal, atuando mais como Executivo que Judiciário, que por medida liminar manteve o questionável AM (auxílio-moradia) aos magistrados (com exclusão dos juízes aposentados) e o então governo Dilma Rousseff aportou recursos suplementares ao Orçamento da União para esse fim suficientes para pagá-lo até dezembro/2016, nada além disso.
Os Estados-membros da Federação foram na mesma toada. Por isso mesmo, não há chance de permanência do AM à magistratura a partir de janeiro/2017. Espera-se, outrossim, que o AM seja substituído validamente pelo ATS/VTM (Adicional do Tempo de Serviço/Valorização do Tempo de Magistratura). É a única medida de justiça possível no momento.
Tudo o mais que sobejar aos valores dos subsídios de ministro do STF e que não correspondam às necessidades práticas do desempenho da própria função pública é “penduricalho” e deve ser abortado da folha de pagamento dos juízes e, por igual, de todo e qualquer servidor público no país, enquanto prevalecer esse paradigma constitucional.
As distorções no regime remuneratório do serviço público em geral e da magistratura, em particular, não justificam esse mesmo regime, antes o contrário: o defraudam.
O problema maior que ocorre é o jogo de pressão política que gente interessada em vantagens a qualquer custo, ainda que sem forma e/ou figura jurídicas, insiste em proceder para se locupletar com as inúmeras e graves distorções ora estabelecidas Brasil afora no regime remuneratório da magistratura e de outros segmentos de Estado.
A autonomia dos Tribunais, desse modo, pode servir de instrumento útil à desconstrução da ordem constitucional prevista para o sistema remuneratório da própria magistratura. Com base nisso, não é impossível constatar que pagamentos indevidos em causa própria possam vir a ser implementados à revelia da crítica social, haja vista um corporativismo exacerbado que a tudo acomoda sutilmente e a todos fazem cooperar na obscuridade.
Além disso, a política de subsídios virou gancho para a disseminação da “supremacia dos interesses”, bandeira do patrimonialismo tupiniquim que não encontra escrúpulo para administrar a coisa pública como se privada ou corporativa fosse. Os bens e recursos do Estado são, todavia, intergrupais e devem ser auditados pelo povo.
Vale destacar, ainda, que o Conselho Nacional de Justiça (responsável pela fixação do AM à magistratura no momento) não detém poderes constitucionais legisferantes, senão unicamente regulamentares. Ora, a regulamentação de uma lei complementar (LOMAN de onde se extrai o registro normativo de eficácia contida para o AM, porque depende de legislação ordinária concretizadora, mas jamais editada pelo Congresso Nacional), quando necessário, passa pela legislação ordinária, antes de merecer a regulamentação normativa em sede administrativa. Portanto, o auxilio-moradia, tal como atualmente concedido aos magistrados, é frágil e juridicamente inconsistente.
Deve-se pensar também que os aposentados não foram contemplados com o benefício e, se é verdade que a LOMAN possa ser aplicada desde logo, menos certo não seria que os aposentados deveriam do mesmo modo merecer a mesma destinação normativa, objeto de regulamentação arbitrária. De fato, o AM foi um “jeitinho” para acomodar a “tropa”, bem o sabemos. O apego ao benefício, tal como contemplado, não faz o menor sentido.
Observo, sobre o mais, que também luto por justiça remuneratória, mas a nossa remuneração tem de ser em valores honestos, não a título de “penduricalhos” que distorcem toda a justiça aplicável ao caso.
Além da eliminação das distorções e da garantia de atualização remuneratória, muitíssimo mais importante é o advento da remuneração adicional por tempo de serviço, ou o seu equivalente. Isso vai garantir justiça remuneratória na carreira, porque não é possível que juízes na casa dos 20 anos de idade, recém-ingressos na carreira e com pouca ou nenhuma experiência percebam o mesmo valor que um juiz, digamos, com 20, 30, 40 anos de judicatura. É um escárnio essa situação, porque desmoraliza o magistrado de carreira e o desestimula. É por isso que se diz que a magistratura virou emprego de luxo para “mauricinhos” e “patricinhas”.
Além disso, com o advento do ATS os inativos estariam igualmente contemplados sem comprometimento do registro-teto dos subsídios da magistratura.
Justiça é o que se pede.
Vale lembrar que quem eliminou os adicionais por tempo de serviço foram os próprios magistrados ao transformar a sua remuneração em subsídio. Também não é demais registrar: adicionais são remuneração e, portanto, sujeitos ao pagamento de impostos e ao limite salarial.