14:08Esbulho possessório

Trecho do artigo de René Dotti, na Gazeta do Povo, sobre a invasão da UFPR 

O esbulho possessório (eufemisticamente chamado de “ocupação”) da Universidade Federal do Paraná, a mais antiga do Brasil, é um fato abominável e sem precedentes mesmo durante o malsinado regime militar (1964-1985). Mestres e estudantes foram mantidos em cárcere privado e impedidos de ensinar e de aprender. Instigados por facções políticas e ideológicas de origem externa, aprendizes de feiticeiro, apóstolos do fascismo e ingênuos estagiários do caos são apoiados pela omissão ou leniência de autoridades, familiares e de alguns professores da arte de cooptação política, que subestimam princípios e regras do direito para insuflar caminhos sedutores da anomia. Mais impressionante é a tentativa de dissuadir os invasores, promovendo um tipo de “diálogo entre a corda e o pescoço”, em vez de acionar o Judiciário.

Leia a íntegra do texto:

O atentado fascista na universidade

Aprendizes de feiticeiro, apóstolos do fascismo e ingênuos estagiários do caos são apoiados pela omissão ou leniência de autoridades, familiares e professores

A Constituição garante, a partir de 18 anos, a eleição para vereador; com 21, é possível ser deputado federal ou estadual, prefeito, vice-prefeito e até juiz de paz, que tem competência para celebrar casamentos. Essas conquistas traduzem o sentimento de esperança de que o jovem de hoje será o ator/colaborador para uma sociedade civil melhor afeiçoada à dignidade da pessoa humana e aos valores e objetivos do Estado Democrático de Direito.

O esbulho possessório (eufemisticamente chamado de “ocupação”) da Universidade Federal do Paraná, a mais antiga do Brasil, é um fato abominável e sem precedentes mesmo durante o malsinado regime militar (1964-1985). Mestres e estudantes foram mantidos em cárcere privado e impedidos de ensinar e de aprender. Instigados por facções políticas e ideológicas de origem externa, aprendizes de feiticeiro, apóstolos do fascismo e ingênuos estagiários do caos são apoiados pela omissão ou leniência de autoridades, familiares e de alguns professores da arte de cooptação política, que subestimam princípios e regras do direito para insuflar caminhos sedutores da anomia. Mais impressionante é a tentativa de dissuadir os invasores, promovendo um tipo de “diálogo entre a corda e o pescoço”, em vez de acionar o Judiciário.

Fui aluno (1954-1958) e professor (1962-2004) na mesma escola de ciências jurídicas que sediou a inesquecível 7.ª Conferência da OAB, de 7 a 12 de maio de 1978, sob a presidência do notável Raymundo Faoro e a coordenação elogiável de Eduardo Rocha Virmond. Aquele evento foi um divisor de águas entre as mazelas do império castrense e as aspirações do Estado de Direito. A sua contribuição para a edição da Emenda Constitucional n.º 1, de 13 de outubro de 1978, foi evidente porque restituiu liberdades públicas, direitos e garantias individuais, sociais e políticas que haviam sido sacrificados no altar do obscurantismo. Na conferência foram discutidas 47 teses cujo material iria subsidiar, dez anos mais tarde, as comissões temáticas da Assembleia Nacional Constituinte, base da Carta Magna de 1988. Mais de mil mestres e acadêmicos de Direito contribuíram para o encontro que teve intensa e exemplar repercussão nacional. Nenhum deles usava capuz, máscara ou petrechos de guerra.

Acredito na resistência pacífica e heroica dos moços do Centro Acadêmico Hugo Simas, de muitos outros alunos idealistas e de professores dignos desse título, que assinam manifesto pela reintegração da liberdade e protestam por outros meios legítimos.

O debate civilizado de propostas dos governos federal, estadual e municipal e de várias frentes da sociedade civil, além de incontestável direito, é também um dever cívico dos alunos conscientes de suas responsabilidades do presente e do futuro. Principalmente quando se trata da qualidade do ensino de qualquer nível. A propósito, em texto sobre o assunto, Ruy Barbosa, um dos mais notáveis homens públicos da história de nosso país, proclamou: “Uma reforma radical do ensino público é a primeira de todas as necessidades da pátria, amesquinhada pelo desprezo da cultura científica e pela insigne deseducação do povo”.

René Ariel Dotti, advogado e professor de Direito, recebeu a Comenda do Mérito Judiciário do Estado do Paraná em 2015.

Uma ideia sobre “Esbulho possessório

  1. Zé Povinho

    Data vênia caro Renê, mas na Universidade quem não diz amém ao seu professor não passa de ano. Conheço um estudante de Direito desta mesma Universidade que me confessou que faz assim, ele procura aprender o jeito do professor, ou seja, do que ele gosta. Aí responde o que ele gostaria de que o aluno respondesse. Este meu conhecido diz que fazendo assim ele aprende mais, o que o professor espera dele e dos demais, e o que ensinam os livros. O trabalho é dobrado mas, segundo ele é até bom, aprende duas vezes, o que deveria ser ensinado mas não é, e o que o professor quer ensinar, ou seja, o que acha que deve ensinar.

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