por Mario Sergio Conti
Passar uns dias em Brasília reforça a conjectura de que o Brasil está prestes – prestes a não se sabe o quê. Com o fim da crença de que o país progride, a capital entrou em estado de atenção, aguarda tudo ao mesmo tempo: delações, protestos, conciliação. A iminência de uma revelação que não se produz está em todas as bocas. A seguir, a algaravia do que elas falaram.
Senadora: Está em andamento um acordo para livrar a cara dos corruptos. Ele está sendo feito nos ministérios, no Planalto, nesse plenário. Mas ninguém diz quem está negociando com quem.
Deputado: O acordo é para anistiar todos os que foram eleitos com caixa dois. Assim, o governo e o sistema político se safam. Os empreiteiros se safaram antes, com as deduragens premiadas.
Senador: Não é bem um acordo. É uma onda, um salve-se quem puder coletivo, um entendimento mudo, uma tabelinha que vai sendo improvisada conforme os novos lances.
Ministro que aparece na delação da Odebrecht: Nunca estive tão angustiado na vida. Por não saber o que vai acontecer amanhã. Não me informo porque chamaria a atenção.
Senador: Num voo para o Rio, o Lindbergh viajou ao lado da Claudia Cruz, mulher do Eduardo Cunha. Ela estava de óculos escuros e se escondia. No desembarque, um grupo veio na sua direção. E não é que o Lindbergh foi para frente dela, estufou o peito e espantou os caras?
Lindbergh Farias, senador: Agi por impulso.
Ministro: Tive uma reunião com a cúpula do Exército. Os generais não pensam em golpe, se bem que estejam preocupados com a segurança nacional. É impressionante o desprezo deles pela Polícia Federal.
Deputado: Num dia, tropeiros tomaram a Esplanada para protestar contra a proibição das vaquejadas. No outro, a Câmara engessou o orçamento da União por 20 anos. Agora noticiam que 160 brasileiros foram assassinados por dia no ano passado – um a cada nove minutos. Está difícil de entender o país.
Cartaz num caminhão estacionado no Eixo Monumental: Quatro mil vaquejadas geram 700 mil empregos.
Juiz: Sei que a vaquejada é um fato cultural. Mas bater em mulher também é.
Ministro: Esse negócio de vaquejada me lembra o Sandro Moreyra. Tem uma crônica em que ele conta a ida da torcida brasileira a uma tourada. Os brasileiros aplaudiram o touro e gritaram “bicha! bicha!” para o toureiro. Foram politicamente incorretos até quando corretos.
Deputado: Não vejo como Temer possa chegar ao fim. A política econômica vai desempregar ainda mais, e você acha que ninguém vai fazer nada? Confio no nosso povo.
Senador: Acho que não vai acontecer nada. Os brasileiros estão cansados.
Deputada: É incrível a irresponsabilidade do poder. O Brasil só piora e Brasília não está nem aí.
Juiz: Prefiro Brasília ao Rio. O Rio onde eu jogava vôlei de praia ficou perigoso. Mas que é difícil mudar o Brasil a partir de Brasília, ah, isso é.
Albie Sachs, ex-juiz do Tribunal Constitucional da África do Sul, que perdeu um braço na luta contra o apartheid: É uma emoção estar em Brasília hoje. Descobri Niemeyer durante o meu exílio, de 11 anos, em Moçambique. Foi um dos maiores homens do século 20. Ele nos ensinou que poderíamos construir o futuro.
Oscar Niemeyer, sobre os seus objetivos com Brasília: Construir uma cidade de homens felizes, homens que sintam a vida em toda a sua plenitude, em toda a sua fragilidade, homens que compreendam o valor das coisas puras.
*Publicado na Folha de S.Paulo