O ACERTO com os corruptos passa à normalidade, assume a acepção de acomodação. Um dia é preso um figurão do PT, no seguinte bloqueiam-se bens de outro, como aconteceu ontem com Emídio de Souza, presidente do partido em São Paulo. Nosso PMDB, velho na guerra da fisiologia, sempre escapa, ou porque ficou com as sobras, ou, como o diabo, sabe fazer a malandragem, não por ser demoníaco, mas por ser velho mesmo.
A Lava Jato, seus procuradores, delegados e o juiz Sérgio Moro, estão a caminho da burocratização, do protótipo do juízo federal especializado contra a corrupção. Veja-se que o juiz Moro quer encerrar o processo antes do recesso de dezembro; se demora, aposenta-se por antiguidade na Lava Jato, perde o atrativo do circuito internacional de conferências e o penchant para ministro do Supremo.
A caça aos corruptos, quando os apanha, libera-os logo depois da primeira delação – esta até inexistente, caso de Cláudia Cruz, mulher do deputado Eduardo Cunha, que continua no Rio sendo processada em Curitiba, desfrutando e compartilhando no zapzap os frutos do trust familiar. Sente-se o odor de ordem de restrição em favor dos honoráveis mafiosos, aqueles seis conhecidos do Brasil: a Justiça, como o marido abusivo, não pode chegar perto deles.
A Lava Jato e a cultura que tenta introduzir evocam aos minguados leitores da História do Brasil os episódios da Revolta da Armada contra a presidência Floriano Peixoto. Nos anos 1893-1894, a marinha de guerra, liderada pelos almirantes Custódio de Melo e Saldanha da Gama apossou-se de praticamente toda a esquadra estacionada no Rio de Janeiro e passou a bombardear alvos na capital da República.
Como no Rio havia expressiva colônic estrangeira, os EUA, França, Inglaterra, Alemanha e Itália mandaram navios de guerra para proteger seus nacionais. Os navios serviam de anteparo entre a esquadra e os alvos. Os revoltosos brasileiros combinavam com os comandantes estrangeiros os horários dos ataques; os embaixadores avisavam seus compatriotas, que se protegiam das canhonadas.
Os cariocas embarcaram no carnaval de guerra. Como os tiros vindos da esquadra tinham dias e horário certos, os cariocas deslocavam-se para locais seguros para assistir a tempo e hora o espocar dos canhões. Floriano Peixoto, porque venceu pelo cansaço, entrou na história como herói da nacionalidade. Os almirantes revoltosos também, via tragédia pessoal, caso de Custódio de Melo, que morreu em combate de espada.
Ainda há gente na avenida Anita Garibaldi cantando vivas e vendendo guirlandas em honra do juiz Moro, dos procuradores e da polícia federal. Logo haverá cronograma e horário para os eventos, esforço heroico de manter viva a revolta de nossa armada brancaleone contra os corruptos. Mas o jato que veio para lavar não tem pressão sequer para molhar os mafiosos médios, que dirá os honoráveis, detentores de quarenta anos de mandatos e prebendas.
(ROGÉRIO DISTÉFANO)