A arte maravilhosa de Rodolfo Zalla (Opera Graphica Editora)
por Célio Heitor Guimarães
Os jovens leitores de gibis certamente não o conheceram e talvez nem tenham ouvido falar dele. Não obstante, Rodolfo Zalla, falecido no sábado 19/06, em São Paulo, foi um dos grandes mestres dos quadrinhos, oriundo da tradicional escola de desenhistas argentinos.
E aqui se faz necessário, desde logo, um parênteses: tal qual o Brasil, a Argentina sempre produziu (e exportou) uma penca de notáveis artistas da pena e do pincel, a partir do extraordinário José Luis Salinas, criador do “mocinho” Cisco Kid. Depois vieram Alberto Breccia, Alberto Zerboni, Angel Lito Fernández, Victor Hugo Arias, Solano López, Florencio Molina, Alberto Salinas (filho de José Luis), Carlos Predrazzini, Arturo Del Castillo, Miguel Angel Repetto, Ernesto Garcia Seijas, Eduardo Risso e Carlos Gomez, para citar apenas alguns. Sem falar, é claro, de Joaquin Lavado, o inigualável Quino, de Mafalda. Rodolfo Zalla compôs o trio, integrado também por Eugenio Colonnesse e Oswaldo Talo, que decidiu trocar Buenos Aires por São Paulo e Rio. Houve quem preferisse Salvador, como o genial Carybé.
Rodolfo Zalla chegou ao Brasil em 1963, onde logo se tornou um dos ícones do quadrinho de terror. Recriou Drácula, Múmia e Frankenstein e deu vida à Nádia, filha do famoso vampiro. Atuou em diversas editoras nacionais, ilustrando também histórias de guerra. Para a Editora Taika, criou Targo, baseado no Tarzan, de Burroughs, O Vingador e Escorpião, uma cópia mal disfarçada de O Fantasma, de Lee Falk.
A partir de 1972, Zalla foi para os estúdios da Abril e para os quadrinhos Disney. São dele os desenhos do Zorro de capa e espada publicados no Almanaque Disney. Colaborou ainda nas HQs dos personagens de Hanna & Barbera, especialmente em He-Man.
Aí, em 1980, decidiu fundar, com o compatriota Colonnesse, o estúdio e editora D-Arte, lançando publicações que se tornariam clássicas, como Calafrio e Mestres do Terror.
Para o escritor e pesquisador de quadrinhos Gonçalo Júnior, Zalla conhecia como poucos a simplicidade que deve ter uma história em quadrinhos para atingir o seu propósito de comunicar e entreter.
Dono de um traço firme e personalizado, ele era formado em arquitetura, mas a sua paixão eram os quadrinhos, paixão que manteve por mais de 50 anos no Brasil. Ilustrou também vários livros didáticos. Aliás, segundo Gonçalo Júnior, “foi o principal responsável pela introdução da linguagem das histórias em quadrinhos nos livros escolares”.
Já o roteirista e escritor Gian Danton destaca o profissionalismo, a correção e a mão amiga do artista falecido: “Rodolfo Zalla era um editor das antigas, da época de ouro do terror brasileiro. Em suas revistas Calafrio e Mestres do Terror, ele abriu espaço para novas gerações de artistas nos anos 1990. Além de tudo, era alguém muito correto, um dos poucos editores brasileiros que sempre pagava pontualmente seus colaboradores. Em suma: a D-Arte foi durante décadas um local em que quadrinistas brasileiros podiam mostrar seus trabalhos, publicar e serem pagos por isso. O fim da Calafrio e da Mestres encerrou o filão de terror, um filão que Zalla manteve praticamente sozinho durante muito tempo. Vai deixar saudades, assim como suas revistas”.
Em 2012, foi lançado o DVD “Ao Mestre com Carinho”, produzido pelo cartunista Marcio Beraldi, que narra a história do artista. O documentário foi premiado na 25ª edição do HQMIX, considerado o “Oscar brasileiro dos quadrinhos”.
Rodolfo Zalla lutava com um câncer recentemente descoberto. No próximo mês de julho completaria 85 anos de idade.