14:32Esquema mostra a tentativa de ‘crime perfeito’

por Igor Gielow

Os detalhes que emergem da delação da Andrade Gutierrez, adiantados nesta quinta (7) pela Folha, sugerem como o esquema do petrolão de fato era uma tentativa de executar um crime perfeito.

O ex-presidente da empreiteira Otávio Marques de Azevedo anotou em uma planilha as obras tiveram superfaturamento usadas como fonte para o pagamento de propina para o PT e aliados de forma legal.

Com isso, fica detalhado pela ponta de um corruptor de primeiro time o “modus operandi” apurado desde o começo da Operação Lava Jato: uma engrenagem na qual o partido do governo recebia legalmente recursos vindo de empreiteiros por meio de desvios em obras públicas.

Como a apuração já demonstrou fartamente, os desvios ocorriam em superfaturamento de todos os gêneros: aditivos, obras com projetos executivos inflados e afins. Para girar, a roda precisava de funcionários públicos dedicados e amaciados com porcentagens do negócio, no caso os diretores e executivos da Petrobras já identificados e punidos até aqui.

Para ficar com a obra superfaturada, negócio que muitas vezes chegava a centenas de milhões de reais ou mais, o empreiteiro agradava ao governo. Em troca, financiava os “pixulecos” eventuais a executivos e operadores, esses de forma geral flagrantemente ilegais, e também doava “por dentro” para os partidos políticos.

Foi assim, segundo a delação da Andrade, que o recurso chegou às campanhas de Dilma Rousseff em 2010 e em 2014, entre várias outras –PT e PMDB à frente.

Com isso, o dinheiro podia chegar sem correr o risco de ser identificado como caixa dois –que, como as próprias delações na praça já indicam, continuou existindo também, na forma de pagamentos indiretos a fornecedores de campanha, por exemplo. Desde a apuração e condenação do esquema do mensalão, a criatividade dos operadores para fugir dos holofotes só fez crescer.

Como Azevedo indicou na negociação de sua delação, há estimativas de quanto do dinheiro doado era oriundo de propinas –cerca de R$ 10 milhões, no caso de 2014. Mas trata-se de um dinheiro sem carimbo: parece tarefa incontornável descobrir exatamente quantos reais foram de propina e quantos foram legais para cada partido que o recebeu.

Daí a teoria do crime perfeito, que sustenta até aqui defesa dos acusados de favorecimento: o dinheiro, afinal, não tem o selo “propina” nele).

De todo modo, o esquema já desvelado é um círculo agora fechado que deverá ter novos atores graúdos a confirmá-lo, e parece improvável que o PT e aliados convençam alguém de que não sabiam de nada.

*Publicado na Folha de S.Paulo

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