Eles se cuspiam. Mas não era qualquer cuspe. Cuspiam e atingiam a cara do antagonista com propriedade, com sabedoria, aquela, de quem sabe tudo – principalmente de política. As palavras saíam fortes, um queria falar mais alto que o outro e discorriam sobre o destino da nação, o destino do Estado, da cidade, da rua, até daquele bar onde estavam sentados num canto, derrubando algumas cervejas, para azeitar o palavrório, e beliscavam pedaços de uma linguiça que antes boiava em gordura na estufa colocada no balcão. Ah se os mandarins soubessem da existência deles – para dar um jeito na coisa! Um estava à esquerda da mesa. O outro, à direita. Isso na visão de quem entrava ali. Na do dono do boteco, de saco cheio daquilo que se repetia todo início da noite, era o contrário. E dá-lhe disparos de perdigotos. Não sentiam os projéteis de baba explodindo no rosto. Às vezes limpavam com as mãos engorduradas. Passou muito tempo até que um dia saíram no tapa. O país estava em carne viva, os nervos à flor da pele. Se atracaram, rolaram no chão, agarraram os pescoços inimigos. Ninguém conseguia apartar. Quase morreram sufocados. Na hora da briga, a televisão do pedaço passava propaganda política de um partido. Quem aparecia ali evocava uma solução: a terceira via. O desastre estava próximo.