por Sergio Brandão
Vovó Muchina é uma senhora já dos seus 70 e tantos anos. É baixa, cabelos bem brancos cacheados, usa óculos de armação redonda e fala fino. Sua principal característica é a boca bem grande que chama atenção de qualquer um. Como toda velhinha, encanta crianças, ou pelo menos uma – Helena.
As duas se conheceram em janeiro, em Guaratuba. O encontro aconteceu numa feirinha, na praça em frente à igreja matriz. A velha senhora se apresentou e ali começou uma amizade, que na verdade não esquentou muito.
Dois dias depois, voltei da praia pra casa e esqueci a amizade delas, da vovó com Helena, que ficaram na praia.
No final da semana seguinte, voltam todos pra casa e pra minha surpresa Helena traz vovó Muchina se destacando na bagagem. Só que desde a chegada da praia, a velha senhora foi simplesmente abandonada. No máximo rápidas conversas na primeira semana. Como a relação não esquentou, vovó foi pra gaveta.
Hoje, saindo pra almoçar, Helena me diz: “Pai, posso levar um brinquedo ? Digo a ela que sim, mas desde que seja algo pequeno.
Helena estava ensaiando a volta, o retorno da vovó Muchina. Agora, mais sagaz, mais esperta, mais ágil. Me entrega a boneca, afinal era comigo que vovó Muchina tinha tido vida. Um fantoche, que como disse, foi comprado na feirinha da pracinha de Guaratuba.
Marta ao volante eu com Vovó Muchina se preparando para suas peripécias mais uma vez. Precisei buscar dentro da alma a tal da vovó Muchina. Aos poucos, ainda com certa timidez, vovó vai renascendo. A cada troca de ideias e de uma conversa que parecia não ter mais fim, renasce a amizade das duas. Helena se diverte. Ela gosta da brincadeira, da fantasia. Uma pequena pausa para o almoço. Mas já estava bem claro que vovó Muchina tinha renascido.
No caminho, de volta pro carro, já depois do almoço, vovó ataca Helena, tentando tirar de seu bolso umas balinhas de goma. Tenta convencer a menina que aquelas balas são ideais para uma senhora, sem dentes, que esqueceu a dentadura em casa. Helena se apieda da pobre senhora, mas não cede, não entrega as balas.
Já dentro do carro, as duas retomam outra conversa proposta por Helena – para tirar a atenção da senhora, que ainda parecia tentar mais alguma coisa com as balas da menina.
Helena vence, e desce o vidro da janela e propõe que vovó tome um ventinho para se acalmar.
Toda saltitante, mesmo com a idade um pouco avançada, vovó pula como um canguru do banco da frente para o de trás, onde estava Helena. As duas se divertem – Helena muito mais – vovó sente o peso da idade e se agarra no trinco da porta e de cabeça para fora do carro já em movimento, imaginado que está voando. A sensação dos cabelos soltos lhe dão mesmo a impressão no ar. Helena percebe e, em gargalhadas, segura a pobre velhinha, com medo de perdê-la para o vento. O caminho é curto e as duas chegam eufóricas em casa.
Vovó deita-se para fazer a sesta. Helena ainda provoca vovó, mas a velhinha não reage mais.
Entra em ação a mãe de Helena, Marta. As duas tomam o caminho da casa do vovó Iná, o caminho de todos os domingos à tarde.
Vovó Muchi e vovó Iná, as legítimas avós de Helena, não sabem, mas emprestaram as inciais de seus nomes para vovó Muchina, para uma brincadeira, um sonho que tomara, não tenha fim.
Agora, vovó Muchina, como no filme Toy Story, deve alegrar outras crianças de uma creche em Curitiba.