18:07A opinião do imbecil

De Umberto Eco, em entrevista a Eduardo Wolf na revista Veja:

Foi um estrondo a sua declaração, em uma cerimônia na Universidade de Torino, de que a internet dá voz a uma multidão de imbecis. O que o senhor achou da dimensão que o assunto tomou?
As pessoas fizeram um grande estardalhaço por eu ter dito que multidões de imbecis têm agora como divulgar suas opiniões. Ora, veja bem, num mundo com mais de 7 bilhões de pessoas, você não concordaria que há muitos imbecis? Não estou falando ofensivamente quanto ao caráter das pessoas. O sujeito pode ser um excelente funcionário ou pai de família, mas ser um completo imbecil em diversos assuntos. Com a internet e as redes sociais, o imbecil passa a opinar a respeito de temas que não entende.

Mas a internet tem seu valor, não?
A internet é como Funes, o memorioso, o personagem de Jorge Luis Borges: lembra tudo, não esquece nada. É preciso filtrar, distinguir. Sempre digo que a primeira disciplina a ser ministrada nas escolas deveria ser sobre como usar a internet: como analisar informações. O problema é que nem mesmo os professores estão preparados para isso. Foi nesse sentido que defendi recentemente que os jornais, em vez de se tornar vítimas da internet, repetindo o que circula na rede, deveriam dedicar espaço para a análise das informações que circulam nos sites, mostrando aos leitores o que é sério, o que é fraude.

Será que os jornais estão prontos para isso?

A crítica da internet exige um novo tipo de expertise, mesmo para os jornais. E isso é muito importante para os jovens, pois eles não têm, aos 15, 16 anos, os conhecimentos necessários para filtrar as informações a que têm acesso na rede. Ora, assim como quem lê diversos jornais acaba aprendendo a distinguir as abordagens distintas de cada um deles, os jovens hoje precisam aprender a buscar essa variedade de abordagens nos sites que frequentam.

O jornalismo – que é tema de seu novo romance, Número Zero – conseguia desempenhar melhor essa tarefa crítica antes da internet?
A crise do jornalismo começa nos anos 50, com a televisão. Antes disso, os jornais diziam, pela manhã, o que havia acontecido no dia anterior, ou até mesmo na noite anterior. Os próprios nomes indicavam um pouco isso: o italiano Corriere della Sera, o francês Le Soir, o inglês Evening Post. Depois da televisão, os jornais passaram a dizer, pela manhã, o que as pessoas já sabiam. Eles deveriam ter mudado – e não mudaram. Mudar, naquele contexto, significaria reduzir o número de páginas, mas, em vez disso, os jornais ampliaram o tamanho, sobretudo por razões de publicidade.

Ora, como preencher esse espaço?

Três possibilidades. Primeira: aprofundar a informação através de análises e comentários. Alguns jornais foram por esse caminho, com maior ou menor êxito, como o New York Times. Segunda possibilidade: a pura fofoca, que foi o caminho de certos jornais britânicos. Terceira: a repetição das mesmas notícias. Há dois dias, um garoto sul-americano atacou um controlador de trem aqui em Milão com um machado. É uma informação que pode ser dada em uma pequena coluna. No entanto, você olha os jornais e lá estão páginas inteiras sobre o assunto. Pode até ser divertido, enquanto tomo o café, ler mais detalhadamente uma matéria mais longa. Acredito que Hegel estava certo: a leitura dos jornais de manhã é a oração do homem moderno.

2 ideias sobre “A opinião do imbecil

  1. Zé Beto Autor do post

    que barbaridade!! obrigado, sérgio. corrigido. continue assim. abraço. saúde

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