por Sergio Brandão
Por onde andam meus discos? Era uma pilha! Teve época que comprava um ou dois – toda semana, na Wings, Brunetti ou Rei do Disco. Mais tarde, numa fase de rock progressivo, comprava numa loja da galeria Júlio Moreira.
Há alguns anos isso tudo sumiu. Nunca mais vi. As lojas e também minha coleção. Não sei onde foram parar. Só hoje me dou conta que tinha tudo isso. Falo em quantidade e qualidade do acervo. Seria capaz de comprar uma eletrola para ouvir tudo de novo. Todos eram muito bem cuidados. Sempre segurando pelo selo, ou apertando entre a ponta de dois dedos para não tocar no vinil e acabar riscando. Era difícil naquela coleção achar um que estivesse riscado. Pra quem nasceu depois dos anos 80, estou falando de discos de vinil. O famoso bolachão – como a gente chamava.
Numas destas mais de 30 mudanças que fiz, eles ficaram no meio do caminho. Mais de 100 com certeza- talvez 150. Sumiram como somem as coisas que não podem sumir.
Todos carregavam períodos de minha vida em trilhas sonoras. Românticas, rock mais pesado, progressivo, clássico, MPB … independente do estilo, cada um marcou uma fase. Sempre gostei de música, talvez tenha exagerado ouvindo apenas um estilo em determinada época, por isso alguns viraram trilha.
Em alguns casos as trilhas são mais fortes que as imagens, porque também trazem o cheiro daquele período, de um lugar, às vezes de uma pessoa… Ouvir tudo aquilo agora seria um exercício de regressão.
Wings, Brunetti, Rei do Disco, lojas que também sumiram de uma hora para outra – como os meus discos. Estas lojas faziam parte do cenário da cidade.
Junto com meus discos, e estas lojas, algumas paisagens de Curitiba também evaporaram. Sumiram sem que ninguém me dissesse para onde foram: o tip-ti-dog, da Brigadeiro com a Comendador, o Café Alvorada, a banquinha do seu Jaime, na galeria Lustosa, os finais de aula do Caça, do Divina. Do Osvaldo Iwamoto, que sem recursos, só com uma biruta, previa o tempo em Curitiba, melhor que muito satélite de hoje.
Da Rádio Clube, na Barão, depois na Muricy. Da Rádio Independência, na galeria Tijucas. Da Boca Maldita onde se ganhava e perdia eleição. Da rodoviária velha, hoje terminal do Guadalupe, onde embarquei algumas vezes para a Ilha de São Francisco, em viagens intermináveis nas BRs-376 e 101, cheias de atoleiros.
Das filas enormes na primeira sexta de maio, na romaria de Nossa Senhora de Guadalupe, promovida pela Rádio Colombo. Pra não falar das lojas HM e Prosdócimo, ícones do comércio. Lembro de um comercial da HM. Um vozeirão dizia: “Pneu carecou, HM trocou”. Na mesma época o Mercadorama patrocinava a hora certa na tv. Uma voz chatinha, fina e esganiçada dizia: “Mercaaaadorama informa a hora certa…”
Muita saudade do “Viva o futebol”, na Tv-Iguaçu e Rádio Clube, com o inesquecível Dirceu Graeser, que anos antes de morrer gravou “Pássaro livre”, um sucesso (só em Curitiba).
Podia ter sobrado um tijolo do teatro de bolso da Rui Barbosa. Como podiam ter vivido mais um pouco o Edy Franciosi e Antônio Carlos Kraide, com suas montagens teatrais maravilhosas, quase sempre nos auditórios dos dois Guaíras. A Curitiba do Zé Maria Santos, com seu grupo do Cefet – que na raça faziam o teatro de escola acontecer.
Todos os meus discos contam cada uma destas histórias. Cada um deles era trilha de uma destas lembranças.
Era a trilha sonora das minhas histórias com Curitiba.
Belo texto! Boas e nostálgicas lembranças, SB… De uma Curitiba que era elegante nas vitrines da loja “Sloper”, na Comendador Araújo. Que era gulosa nas espessas fatias de pizza da Savóia (também tinha a Savoy com seus sorvetes do tipo “creme holandes” e “creme russo”), e as inesquecíveis vitaminas de frutas batidas. Daquele estilo restou apenas a pizzaria Itália ali na Candido Lopes, resistente aos subways, macdonalds e burger kings. O pernil com verde do Tirnagulo deu lugar a hamburgeres “gourmet” (que são hamburgueres com preço de churrasco completo). Era uma cidade mais ingênua e mais autêntica. Também éramos mais ingênuos e menos tensos. Era possível andar despreocupado pelo calçadão.. o maior risco era levar um beijo da Gilda. Ir ao cinema (Rívoli, Astor, o gigantesco Vitória, o aconchegante Condor) era um programaço! Hoje os cinemas são iguais e a gente nem lembra onde assistiu o último filme. As salas são numeradas. Melhor ver em casa, no now ou netflix…É mais barato e não tem aquele cheiro enjoado de pipoca com muuuita mateiga das redes uci ou cinemark. Nos cinemas daquela outra Curitiba se consumia Mentex, jujuba ou dadinho… o cinema não ficava incrivelmente emporcalhado como após uma sessão de hoje nas salas de qualquer shopping. Precisava de alguma coisa? Lojas Americanas. Hoje a casa China é a dona do pedaço das utilidades domésticas… Pois é, caro Sérgio. Nesta Curitiba dos 322 anos resta acender uma vela em memória ao que foi uma cidade inovadora, sisuda, ingênua, criativa, sempre provinciana (qual é o problema?). Mas essencialmente uma cidade diferente.
Sim, Oto, uma Curitiba diferente. Abraço!
Ah! Que saudades. E também da Confeitaria Iguaçu, da laranjada WIMI, da rádio Ouro Verde encerrando sua programação com o Acalanto de Dorival Caymi, das crônicas do Aramis Milarch, do Festival Internacional de Música, da pérgula (ou churrasqueira do Maciste), do restaurante Nino (no último andar do prédio da rua Pedro Ivo), das esticadas no Gogó da Ema, do camarão “abraçadinho” no Lá no Pasquale do Passeio Público, da agitação da Madame Garfunckel na Aliança Francesa, do Juarez Machado criando anúncios para o Teatro Guayra, dos bailes ao som da Banda (na época Orquestra) do Beppe, do magazine Frishmann (“O amigão”), do Matterhorn e seu famoso (ou sua famosa) fondue, do bar Botafogo, dos comentários sobre o baile de Carnaval no Operário (ou Ópera Rio). Ah! Quanta saudade.
Perfeito, harmonioso e real a descrição sobre Curitiba. Ouso a acrescentar mais fatos pitorescos e locais da cidade, mas, um ou dois personagens são inesquecíveis: Maria do Cavaquinho, que ficava na esquina da Avenida João Pessoa ( nome da época) com a Ébano Pereira esperando as meninas do Instituto de Educação e “puxava a saia delas”. Também outro folclórico foi o “Esmaga” lenda viva e sempre citado pelo jornalista L.G Mazza .
Tudo isso trás boas recordações onde essa passado só retorna em nossas memórias, ainda bem.
Estou fazendo uma pesquisa sobre alguns restaurantes famosos de Curitiba nos anos 50 e 60, alguns citados nas postagens anteriores: Restaurante e Confeitaria Iguaçu, restaurante Matterhorn, Churrascaria Tupã, Sociedade Duque de Caxias, Gruta Azul, Rio Branco. Agradeceria imensamente se alguém me ajudasse a contatar pessoas que tenham frequentadoo essas casas e tenham imagens e fotos sobre eles.