… Pessoas politizadas e honestas consigo mesmas (ou seja, que não exigem do governo um padrão ético que não adotam em sua vida cotidiana) sabem que a corrupção está entranhada na história brasileira e que é o pilar do nosso sistema partidário-eleitoral. Não se trata de derrubar um governo, mas o pilar.
Trabalhar para modificar essa estrutura é o que se esperava de um partido de esquerda que pregava a lisura administrativa. Em vão. Não fossem o vigor das conquistas sociais e a inexistência de uma oposição digna do nome, o PT já estaria fora do poder.
de Luiz Fernando Vianna em artigo na Folha de S.Paulo (ler a íntegra abaixo)
Contas a pagar
Se centenas de milhares de pessoas foram ontem às ruas, não adianta reduzi-las a “coxinhas” ou “golpistas”, como tentam fazer defensores do governo. O momento sugere um comportamento mais adulto.
O PT está pagando por opções que fez. Enquanto o cenário econômico internacional (commodities em alta) e a força de seus projetos sociais impulsionaram o país, deu para manter o pacto silencioso entre os mais ricos e os mais pobres, pois ambas as partes estavam ganhando.
Em sua primeira gestão, Dilma buscou conservar a precária harmonia adiando aumentos de tarifas e outras medidas desagradáveis. Reeleita, sentiu-se autorizada a abrir de uma só vez a torneira de maldades. Está prejudicando os mais pobres e dando munição concreta para aqueles que só têm uma bandeira um tanto abstrata: a do combate à corrupção.
Abstrata não por falsa ou ilegítima, mas porque lhe falta perspectiva histórica. Pessoas politizadas e honestas consigo mesmas (ou seja, que não exigem do governo um padrão ético que não adotam em sua vida cotidiana) sabem que a corrupção está entranhada na história brasileira e que é o pilar do nosso sistema partidário-eleitoral. Não se trata de derrubar um governo, mas o pilar.
Trabalhar para modificar essa estrutura é o que se esperava de um partido de esquerda que pregava a lisura administrativa. Em vão. Não fossem o vigor das conquistas sociais e a inexistência de uma oposição digna do nome, o PT já estaria fora do poder.
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Ontem, em Copacabana, observando alas da classe média exercendo o direito democrático de odiar o PT, era impossível não perceber no uso do verde e amarelo o velho recurso de ocultar sob um signo de união (as cores nacionais) um desejo de exclusão: o país é “nosso”, não “deles”.