17:09Sobre o metrô e Variant

por Yuri Vasconcelos Silva

Erre de Bastos comprou um carro importado. O arquiteto-estrela da cidade trocou seu velho por um cheio de tecnologia, couro e touch screen. Depois de uma semana rodando, com direito ao trânsito da Visconde às dezenove horas, ficou deprimido. Deu-se conta que não consegue usar todos os luxos do carro. Aliás, mal sabe acioná-los. Banco com massageador, aquecimento no volante para as mãos, dezenas de bips e vozes sexies femininas alertando sobre inúmeras condições do carro. Ele pagou mas não vai usar. Apenas mostrar seu status. Ir e vir poderia ser até mesmo com a Variant azul que sonhava quando moleque.

Curitiba comprou um metrô. Tecnologia subterrânea de transporte em massa. Vagões bonitos fabricados por empresas internacionais. Símbolo de uma cidade moderna. Mesmo que seja num esquema simples, cavar e colocar uma tampa, fazer buraco é sempre muito caro. Como Erre de Bastos, vamos perceber em pouco tempo o desperdício de recursos em uma solução tão vistosa mas limitada quanto este metrô.

Na década de 1970, Curitiba precisava implantar avenidas com 60 metros de largura para vias arteriais que dessem conta do fluxo de veículos na crucial hora de entrada e saída das pessoas em seus trabalhos e escolas. O plano diretor original pretendia rasgar bairros, desapropriando imóveis ao longo do trajeto, apagando parte da história em cada edifício demolido. Como a cidade não tinha dinheiro, engenheiros e arquitetos se debruçaram sobre o problema e, em algum momento perdido na história, talvez em uma noite fria enquanto tomava sopa russa, alguém teve a visão de dividir a largura de 60 metros em três partes separadas por quadras. De um lado, aproveita-se a rua já existente e a transforma em uma avenida que vem. No outro lado, a que volta. No meio, uma canaleta com mão dupla somente para ônibus rápidos e, acompanhando esta canaleta, vias lentas para os carros. Assim surgiram as estruturais, não tão caras mas eficientes, ligando os pontos cardeais de Curitiba, estas vias de escoamento não só permitem o trânsito crítico da cidade, mas também conduzem o crescimento ordenado, já que o zoneamento ao longo das estruturais permitem maior adensamento residencial. Prédios mais altos abrigam mais pessoas, que estão a alguns passos do transporte coletivo expresso e, desta forma, poderiam abrir mão do carro. Nota-se uma visão global neste esquema, onde associam-se o transporte de massa ao adensamento direcionado e à expansão da cidade. Esta era a versão “Variant azul” para a mobilidade na década de 1970. Depois disso, ninguém mais teve uma boa idéia sobre o assunto. Parece que faltou sopa Borsch nos últimos 40 anos. Em 2014, com todas as vias trancadas de carros, com ônibus lentos no lugar de expressos, não nos sobrou outra opção a não ser comprar soluções prontas, caras e incompletas

Metrô precisa ter capilaridade, deve chegar em todas as áreas adensadas, em especial a região metropolitana. Deve ter um alto nível de conectividade, interligando-se à todas as outras necessárias linhas de metrô, aos terminais, aeroporto e rodoviária. O que temos é o projeto de uma solitária linha que muito pouco vai aliviar o sistema. Não é uma linha, é um fiapo.

Entre modernizar nossa “Variant” ou gastar muito mais num importadão, Curitiba escolheu o status.

3 ideias sobre “Sobre o metrô e Variant

  1. Célio Heitor Guimarães

    Parabéns, Yuri, pela consciência cívica e cidadã, ainda que os atuais planejadores de cidades como Curitiba não tenham a menor ideia do que seja isso.

  2. wagner

    Pelo jeito vamos ficar com a Variant mesmo, velha caindo aos pedaços. O metrô vai continuar sendo somente o da Alameda Cabral… Não existe a menor vontade de resolver o problema do transporte publico em Curitiba.

  3. leandro

    Perfeito. A análise do quase projeto e não se sabe quando será sequer iniciado, transforma o “metrô” de Curitiba, em um “fiapo” como diz o texto. Da para notar que não só o autor da matéria tem a percepção da cidade como outras pessoas também. Me parece, não tenho a certez de que já ouvi algo parecido com essa história de alguém que se encontra muito perto de nós e que tem grande parte ou quase tudo do que hoje ainda sustenta o transporte de massa na capital e parte da Região Metropolitana com a integração parcial. O “metrô” aqui comentado, é um linha da CEASA até o Santa Cândida ( parece ser isso). Pois bem como está no texto, as vias chadas de rápidas e dos expressos, foram feitas num piscar de olhos, considerando a época, a tecnologia de então. Sim foram desapropriados vários imóveis, nas o resultado está a í, ainda é positivo e é so pensar se não tivesse sido feito na época o que seria hoje. Lembro que teve um candidato a vereador e depois vereador que ironizava as vias da Conectora 5 , prolongamentos das ruas Martim Afonso, Padre Anchieta e Padre Agostinho e levam todo aquele desenvolvimento até a CIC norte. Então dizia o cidadão irônico ” … Maria… João…. Antônio”., Como chamando pessoas pois quase ninguém morava na região ( Já existiam as primeiras vias estruturais, norte e sul) Pois bem isso fopi um planejamento estratégico, devidamente pensado, estudado e colocado em prática. Então de tudo isso ainda vemos que está faltando mesmo criatividade e ousadia com inteligência para fazer acontecer as coisa numa cidade com Curitiba, que já não é a mesma. Assim depois de tudo isso acho que vou tirar a Variant da garagem. EM TEMPO. O pessoal que está hoje fazendo a gestão de Curitiba, bem que poderia perguntar para quem sabe e quém já fez algo que nos deu soluções até hoje. Boas idéias existem, vontade também, o que precisamos é ter a “chamada vontade politica” acompanhada da quebra dos egos pessoais. O autor do texto que não o conheço tem muito da história e do conhecimento técnico do caso e isso me faz voltar um pouco no tempo e rememorar as boas coisas que aqui aconteceram.

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