DIÁRIO DA GRIPEZINHA

Conversar com boneca já é um troço deprimente. Mas consolar uma boneca, mesmo que inflável, não tem preço. “O capitão me deu você de presente, Marylin” – digo a ela. “Eu sei”. “Você não sente falta do capitão?” “Eu, hein!” Um longo silêncio na conversa que já começou mal. De chofre (não confundir com enxofre) Marylin se abre (esse se abre não é o que vocês estão pensando). “Ele mal olhava pra mim; só falava com o garoto”. Perguntei: “O garoto prodígio?” – e me bateu uma puta saudade dos gibis que eu comprava escondido e minha mãe achava e botava tudo no fogo. “Ele respeitava você, Marylin. Talvez não quisesse incomodar e por isso falasse só com o garoto”. Ela, olhando para as unhas esmaltadas de fresco: “Digamos assim que eu entrava em rota de colisão com o piá”. “O piá prodígio?” – brinquei. “Prodígio, não é? Eu sei qual é o prodígio dele”. O que ela não sabe é que o capitão não a comprou para si, para seu deleite, seu usufruto. Comprou pra me dar de presente, mas isso eu não podia dizer a ela. Dizer que, ao final, não passava de uma mercadoria. De repente ela ficou séria. Tentei suavizar a situação pegando numa dobrinha da barriga. Mas eu não sou bom para falar as coisas. Olha só o que eu disse: “A menina está engordando, parece que o pasto é bom por aqui”. Ela me respondeu na lata: “Seja mais econômico na ponhada de ar ne mim, que eu emagreço”. Jolim estava por ali, deu uma risadinha de cachorro e foi deitar na cozinha.

Filme: O SHEIK (direção de George Melford, com Rodolfo Valentino, Agnes Ayres e Ruth Miller – 1921). O mais novo tomava seu sheik de morango, depois de ter faturado todo o condomínio. Os irmãos jogavam xadrez, como se soubessem o que estavam fazendo. Papai estava fora de casa, trabalhando. Um irmão jogava com o Mercado, outro jogava com a boiada e o outro jogava com o Feiquenius. Sem ser convidado, o personagem Imprensa chegou e deu sheik mate em todo mundo.