Foram duas na orelha. Durante uma vida. Duas pancadas bem dadas. Em ambas ocasiões estava bêbado, mas não caí. O que interessa não é isso, mas a coincidência de as muquetas serem recebidas pelo escutador do lado esquerdo. Se fosse hoje, estaria enrascado. O aparelho de surdez iria parar dentro do cérebro – e talvez pudesse decifrar o que se passa ali dentro, até hoje algo incompreensível para o dono da cachola. Outro dia me chamaram de direitona. Será que tem a ver? Logo eu, encantado com a anarquia conservadora inoculada por uma frase do Jorge Luis Borges… Em mim a esquerda apanhou, mas não saiu em passeata gritando a ‘luta continua’. Seria surreal ver orelhas se manifestando na rua enquanto as da direita, ao largo, se cutucavam para cochichar o famoso “eles não aprendem”. Tenho aparelho na direita também. O da esquerda funciona mais. Acho que as pancadas desentupiram o canal auditivo. Mas é melhor não ficar falando desse jeito. Corro o risco de pedirem que eu me filie.