por Marcia Oleskovicz Fruet
Eram quase 16 horas quando chegamos à cracolândia, próxima à Estação da Luz. Antes, uma conversa daquelas de não querer mais parar, os olhos marejados de empatia e esperança, com a secretária Luciana Temer, do Desenvolvimento Social da Prefeitura de São Paulo. Ela disse que era difícil. Nem uma palavra de tranquilidade, mas a boa inquietação que nos faz ir adiante. Em nenhum momento me iludiu com a propaganda (barata) de que são feitas as gestões rasas, com soluções higienistas. Nem a mim, nem a si própria. Me disse que não havia caminho seguro. E eu fui até lá, com a cabeça fervilhando de ideias. Relembro agora e percebo um teco de prepotência e de auto-referência no pensamento da hora. O lusco-fusco das 16h do outono começava a se mostrar. Era preciso apressar o passo que a noite sussurrava no ouvido e a terra já era de ninguém. Eu não queria mais teoria. Entendi, depois, que aquela introdução toda na sala do “De Braços Abertos” seria o guia e o escudo pra (não) vida ali fora.
Sem brinco, sem anéis, sem relógio. Só Francisco eu não tirava do peito. E, principalmente, sem celular. Na saída, a abordagem já tão conhecida de quem estava em seus minutos de clareza e queria tudo o que o estado pode oferecer. Agora. Já. Cadê? Dentro de mim, um alívio vergonhoso de saber que, ali, não era o meu braço em que a moça se dependurava. Eu não era a gestora daquele lugar. Um sentimento egoísta, é claro, mas da maior humanidade que eu dispunha naquele momento. Antes de dobrar a esquina, um “morador” gritou “Tonhão? Dona Marcia?” O Antonio Carlos Rocha era figurinha carimbada pelos anos que trabalhou com os meninos acolhidos e que, não raro, formavam a população de rua de Curitiba. A memória de cada um que passou pela Casa, agora vivo, morto ou naquele estágio intermediário entre coisa e outra, fazia a gente bulir algo lá dentro do peito. “Tonhão, não é possível… Saí de Curitiba e parei aqui, faz uns três anos. Coméquetá o pessoal?” Que se há de responder? Assassinados? Sumidos? Amarrados no trilho do trem, como o Tonho já viu? “Tá tudo na mesma.”
Apesar dos protestos da Jucimeri Silveira, sempre com um zelo carinhoso e cuidadoso, a gente saía abraçando quem era de abraço mesmo. E, naquela hora, foram três. Curitibanos como foram – nasceram no Paraná, passaram um tempo na capital e se estabeleceram no universo paralelo da cracolândia. A assistente social que nos acompanhava nos olhou delatando a vontade que tinha de dizer “viu?”. Me antecipei “quantos anos de intercâmbio, não?”. E seguimos.
Uma senhora levava a menina uniformizada pela mão. Um rapaz fazia entregas na vizinhança, de bicicleta. Um casal trocava carinhos no banco da praça. Destes, nenhum fumava pedra. De certa forma, no entanto, estavam no crack. Naquele mundo de quatro ou cinco quadras, todos eram invisíveis. Ninguém via ninguém. Ao entender isso, tudo se esclareceu: não iriam me roubar as bijuterias, porque eu simplesmente não estava ali! Me tornei, igualmente, transparente. Senti que poderia andar entre os usuários sem grandes inconveniências. Alerta, atenta, sim.
E assim se fez. Até o momento em que o Tonho, de modo tão absurdamente discreto que sequer me passou na cabeça que o pudesse fazer, sacou seu celular. Tirou duas fotos e colocou no modo filme. A capa da invisibilidade se rasgou. De alto a baixo. Gritos, pedras, bitucas, latas cortadas, palavrões e ameaças. Tudo nos atingiu. A proibição do celular não era a possibilidade do roubo. Era o perigo da captura da imagem – tal e qual as crenças de aprisionamento da alma nos primeiros experimentos fotográficos.
[Quando a gente ocupa uma posição de gestão, sobretudo na assistência social, o mundo passa a ser sua preocupação e quase-culpa. Todo o tempo. Em todo lugar. Tive a oportunidade de conhecer muitas experiências interessantes – boas ou não – nessa área e entrei fundo no tema do crack. Curitiba nunca teve, não tem e, acredito, nunca terá algo próximo à cracolândia. (Na campanha, o candidato berrava na TV e nas redes sociais que a cidade “fedia a cocô na imensa cracolândia que virou”. Não sabia e nunca vai entender o tamanho da bobagem que falava.)]
Saí de lá vazia, começo de noite. Nada a sugerir. Nada a replicar. Sem saber se tudo aquilo era bom ou ruim. Era alguma coisa, essa a única certeza. Estavam tentando com todo o conhecimento que tinham, que buscaram, com todas as forças, com o coração. Estavam lá e não tinham medo. Muito menos preconceito. Acreditavam no que estavam fazendo e isso me bastava. Era o estímulo e a experiência que eu poderia ter e levar adiante. Era o caminho possível, o mais humanizador, o que apontava pra algum resultado. Se era ou foi pouco? Pode ser. Mas era um caminho. Minha tristeza, dura, sem ingenuidade, de quem deixou de acreditar na pureza dos usuários na segunda quinzena de gestão, ao acompanhar agora a nova “estratégia de atendimento”. Se vai prestar? Espero, do fundo da minha alma, que sim. Assim, derrubando prédios com gente dentro, se “nóias” ou não, nos dá desesperança. Não há luz no fim do túnel. Sequer túnel há.
Essa exposa do exprefeito FRUET nada fez pela área social de Curitiba em 4 anos,agora quer se fazer de boa samaritana.
Sabe oque é isso ?
Ano que vem tem eleições e tanto ela como o ex prefeito Fruet não querem largar o osso.
Bingo!!!
O bom é que a carroça continua sempre em frente… e os cães continuam ladrando no seu caminho!!
Oportunistinha. Só causou problema na Prefeitura de Curitiba, não fez nada de producente para a área social. e agora vem com “papinho”.
Melhor um abraço do que o nojo do Greca, não acham coxinhas ? Não ela não trabalhou, quem mais trabalhou foi a Mulher do Piá de Prédio e quem agora, a Marguerita do Zapata. Porra meu, quando merda, quanta alegria. Acorda seus manés.
Bom mesmo é o cara que vomita quando sente cheiro de pobre.