por Ruy Castro
O apelido, Marinheiro Sueco, lhe foi dado por Nelson Rodrigues, de quem era um dos “irmãos íntimos” –os amigos com quem Nelson, nos anos 70, falava todos os dias. Na verdade, chamava-se Hans Henningsen. Para Nelson, alguém com esse nome e daquele tamanho (quase dois metros) só podia ser um marinheiro sueco, foragido de uma peça de Strindberg. Mas Hans era de Tenerife, nas Canárias, de pai alemão e mãe espanhola, e carioca desde que chegou ao Rio em 1955, aos 20 anos.
Em certo momento, foi muito poderoso no futebol. Era o operador da Puma na contratação de atletas para usar seu material esportivo. No começo, a Puma não se comparava à gigante Adidas. Hans ajudou-a a crescer, contratando Pelé, Carlos Alberto Torres, Fittipaldi, Beckenbauer, Cruyff, Zico, Junior, Falcão, Cerezo, Maradona, todos no apogeu. Não eram só contratados, eram amigos. Hans viajou o mundo com eles e se dava com suas famílias.
O telefone tocava em seu apartamento em Copacabana e, no outro lado da linha, era algum herói do passado: Di Stefano, Puskàs, Obdúlio Varela, Gigghia, Zizinho ou Garrincha. Ia à Europa a trabalho três ou quatro vezes por ano (Buenos Aires era seu quintal) e, na volta, nos trazia discos, livros ou uísques raros. Nos restaurantes, ninguém pagava a conta em sua mesa –Nelson Rodrigues o chamava de “Onassis de tanga”.
E era mesmo porque, íntimo de craques e cartolas, poderia ter ficado rico se negociasse jogadores. Mas nunca negociou ninguém. Nos últimos 20 anos, vivia de escrever sobre futebol para jornais europeus, dar “furos” e levar calote. A imprensa brasileira não se interessava por ele. Marinheiro morreu neste domingo, duro, triste e só.
Era seu amigo desde 1970. De quatro em quatro anos, eu lhe perguntava quem ia ganhar a Copa do Mundo. E ele nunca errou nenhuma.
*Publicado na Folha de S.Paulo