por Elio Gaspari
Durante as seis horas de caos em Washington, Bolsonaro pôs suas fichas no cavalo errado.
Ele disse o seguinte: “Eu acompanhei tudo hoje. Você sabe que sou ligado ao Trump. Então, você sabe qual a minha resposta aqui. Agora, muita denúncia de fraude, muita denúncia de fraude. Eu falei isso um tempo atrás e a imprensa falou: ‘Sem provas, presidente Bolsonaro falou que foi fraudada as eleições americanas”.
Poucas vezes houve tamanha afinidade entre um presidente brasileiro e seu colega americano. Quando Bolsonaro disse que “sou ligado ao Trump”, apontava para uma conexão que vai além da simpatia.
Por mais delirante que Trump tenha sido em sua conduta durante a pandemia, não há vestígio de picaretas agindo com relativo sucesso na burocracia da saúde pública americana.
Trump encrencou com seu vice. Bolsonaro também.
Trump quis militarizar o feriado de 4 de julho nos Estados Unidos botando tanques nos jardins da Casa Branca. Bolsonaro desfilou blindados fumacentos diante do Planalto.
Salta aos olhos diferença na relação com militares sob Trump e Bolsonaro
É no capítulo das relações com os militares que salta aos olhos uma diferença entre o que aconteceu nos Estados Unidos e o que acontece no Brasil.
Lá, como cá, apareceram militares da reserva propondo excentricidades. Um general trumpista da reserva queria colocar o país sob lei marcial. Ficou no palavrório.
O general Mark Milley, chefe do Estado-Maior Conjunto dos EUA, sentiu cheiro de queimado na movimentação dos trumpistas antes do 6 de janeiro.
Vendo uma manifestação em Washington no dia 2, ele cravou: “Esse é um momento do Reichstag. O Evangelho do Führer”.
Era uma comparação com os assaltos de Hitler ao regime democrático da Alemanha.
Não há prova de que Trump tenha tentado mover tropas do Exército, Marinha ou Aeronáutica no seu pastelão. Pelo contrário. Na tarde do dia 6, quem pediu tropas foram os democratas Nancy Pelosi e Charles Schumer.
No dia 8, quando Trump já estava no chão, Pelosi, presidente da Câmara, telefonou para o general Milley, argumentando que o presidente estava fora de si e poderia fazer outras maluquices. Ela especulava a possibilidade de declará-lo incapaz.
Quanto às maluquices (o uso de armas nucleares para criar um caso), Milley tranquilizou-a. Quanto à declaração da incapacidade de Trump, ele cortou: “Eu não vou caracterizar o presidente. Não é meu papel”.
Acusar Bolsonaro de curandeirismo é ofensa a muitos pajés
Madame Natasha acompanha as sessões da CPI da Covid mascando cloroquina e decepcionou-se com a intenção dos senadores de acusar Bolsonaro por “charlatanismo e curandeirismo” durante a pandemia.
Charlatanismo, vá lá, mas falar em curandeirismo é uma ofensa aos muitos pajés do círculo de amizades da senhora.
O charlatão sabe que o óleo de peixe não cura reumatismo. Já o curandeiro acredita nas virtudes de suas poções.
Zé Arigó (1921-1971) foi um homem honesto. João de Deus, antes de ser apanhado em seus delitos sexuais, fez fama atendendo muita gente boa. Isso, para não mencionar os milhares de pajés que cuidaram de indígenas. O cacique Takumã Kamayura (1932-2014) é hoje uma lenda para os povos do Xingu.
Natasha acredita que essa confusão é crendice de homem branco.
*Publicado na Folha de S.Paulo
A diferença está nos militares,os de lá enquadraram o Trump,os de cá lambem as botas do imbecil presidente.