8:00Engolidores de sapo

por Mariliz Pereira Jorge

Uma pesquisa diz que mandar alguém se foder como forma de desabafo faz mais bem à saúde do que tomar duas taças de vinho tinto por dia. Mentira. Essa pesquisa nunca foi feita. Mas não é preciso ser um gênio pra saber o alívio que o coração sente ao poder extravasar todo tipo de frustração, raiva, angústia e sapos engolidos todos os dias.

Tenho uma coleção de impropérios dirigidos a outras pessoas. Essa garota te largou porque você é um babaca mesmo. Acho um saco almoçar na casa dos seus pais todo final de semana. Imagino se você conseguiria pagar as suas contas com o salário que me paga. Arranja outro trouxa pra fazer isso. Vai procurar suas negas.

Mais recentemente, um “vai procurar uma rola” tem resolvido todos os meus problemas. É um desabado simples, mas não objetivo, que ainda deixa a pessoa tentando entender exatamente o que quero dizer.

Resolve de imediato o problema com aquele cara que só te enrola e que você gostaria de mandar um: “ou fode ou sai de cima, chega de ficar me marmitando”. “Que tal parar de tomar suco detox e cagar regra?”, para a amiga cheia de opinião. “Lembrou de mim agora que tomou um pé, não é mesmo?”, para qualquer um que some quando namora.

Já disse todas essas coisas. Já disse mais de mil vezes. Tudo em pensamento. No máximo falando sozinha. Sozinha e em alto bom som, dá até para esbravejar, subir a voz, se encher de razão, continuar falando, cada vez mais convicta de que está certa. Olha que maravilha, ninguém vai discordar. E vai dar um aliviozinho.

Não é a mesma coisa. Quando a gente está puto com alguém ou com alguma situação, nada parece melhor do que fazer o motivo do nossa putice se sentir uma titica. Às vezes, pode até valer a pena, mas às vezes não é todo dia e nem sempre. A gente não tem estrutura emocional para se suicidar socialmente e depois continuar vivendo com a sociedade.

É o preço. Esse papo de que as pessoas esperam sinceridade é caô. A maioria não quer, não está interessada ou não se importa com o que você pensa. Seu chefe está se lixando para o que você acha dele. Sua amiga vai te detestar quando você disser que ela está solteira porque é chata. Sua sogra… bem, você quer arrumar problema com a sua sogra? Com o vizinho? Ou com o porteiro? Sei que vou morrer com vontade de chamar o flanelinha de achacador e maloqueiro.

Só dá pra mandar um “chupa, mundo” quando temos certeza que é adeus pra sempre. É sem volta. É fim de romance. É passar no RH. É deletar a amizade. É pedir o Uber. É esperar o caminhão de mudança. Melhor se for bem de longe. Por telefone. Carta. Ou email. Aí é só correr para torcida porque meio mundo vai morrer de inveja de não ser meio bundão-meio engolidor de sapo.

Mas tem que saber quando vale a pena mandar um chupa. Se ele pode ser pessoalmente, à distância ou por meio de recado. Ou quando o melhor pegar o caminho do bar, encher a cara de vinho e deixar a putice passar.

*Publicado na Folha de S.Paulo

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