7:18Socorro!

por Célio Heitor Guimarães

Creio que a minha dúvida é a de muitos brasileiros: abandono o Brasil ou desligo a TV? Do jeito que está não dá para ficar. É só morte, violência, ladroagem, patifaria, canalhice. Sei que a TV não é a culpada, mas adora. Começa cedo, de manhãzinha; na hora do almoço (ou logo depois), a Maju tira-nos o apetite ou faz com que ponhamos para fora o que havíamos comido. É uma coisa de louco! Na quinta-feira passada, foram exatos quarenta minutos de tragédia: guerra de quadrilhas no morro carioca, tiroteio, balas ao léu, uma mãe foi morta ao proteger o filho, invasão de domicílio, sequestro, milicianos dominando o território… A PM entra em ação: mais violência, mais sangue derramado… Aí, lembrei-me que a Maria Júlia nem havia ainda entrado na pandemia, o que, por certo, duraria mais meia hora. E teria também o capitão-reformado… Levantei-me, abandonei a TV e fui descansar no banheiro. Agora, estou digitando estas letrinhas.

Na TV, onipresente e permanentemente ligada em nossas casas graças à Covid 19, é uma nova emoção por dia. A mais recente é a protagonizada por aquela pastora-deputada que, em nome do senhor jesus, adotou 52 filhos e mandou matar o marido, que já fora um de seus filhos e genro. O serviço foi feito por outros três filhos. Agora, ela tem oferecido uma das filhas a quem interessar possa. Sim, eu sei que a televisão não inventa, mas faz questão de alardear.

Que o Brasil está uma desgraça todo mundo sabe. Basta lembrar quem está no comando. Mas é preciso enterrar todas as tragédias dentro de nossas casas todos os dias, de manhã à noite? Será que alguém, em algum lugar, não está se atrevendo a fazer alguma coisa boa, digna, alvissareira, capaz de elevar o nosso moral e oferecer-nos um mínimo de esperança? Se tem, a TV ignora. Não dá audiência. Pelo menos é o que me diz o meu filho, que é jornalista televisivo em atividade e afirma ser necessário proceder de acordo com a realidade existente.

Tenho certeza, porém, que ele, como eu, prefere quando a TV mostra a força que tem e o jornalismo brilhante que também sabe praticar. Como agora está fazendo a Globo, ao enfrentar, com competência e resultado, o prefeito carioca, também pastor evangélico e outro malandro de carteirinha, que, de olho na reeleição, mantém com o dinheiro público lacaios encarregados de silenciar a população que se queixa do péssimo atendimento da rede hospitalar municipal do Rio de Janeiro.

“O tempora! O mores!” – bradou Marco Tulio Cícero, nas célebres Catilinárias, no Senado Romano. Para quem não é versado no latim: “Oh tempos! Oh costumes!” E isso 68 anos antes de Cristo! Protestava contra os vícios e a corrupção de seu tempo, quando conspirações governavam Roma. O que diria hoje o notável tribuno?

O que me causa espanto (e pavor) é que a grande maioria do povo brasileiro é de boa índole, gente decente, trabalhadora, digna. No entanto, são as minorias criminosas que se sobressaem. Na política, da administração pública, na polícia, nas cidades e nas comunidades. A maioria, no entanto, silencia, esconde-se, tem medo. E os lugares vagos são ocupados pelos bandidos, pelos criminosos, pelos estupradores e pelos corruptos de toda natureza.

Na semana passada, completei 80 anos, coisa que jamais imaginei. Ou, melhor, como ensinava o meu querido e saudoso Rubem Alves, “desfiz 80 anos”. “Quando anos tenho? Não sei; sei quantos não mais tenho”. No meu caso, 80. Quantos ainda tenho, só Deus sabe. Um, dois, nenhum? É coisa para o Altíssimo responder. Só torço para que do outro lado, se houver outro lado, tudo seja diferente e não haja TV.

Digo a minha idade para dizer que, com todo esse tempo nas costas, pensei que já havia visto e vivido tudo. Não havia, como constato agora, em plena pandemia que nos prende em casa e nos tira a vida, neste Brasil de 2020, sob a proteção do Messias que não é aquele.

8 ideias sobre “Socorro!

  1. Rogério Rincoski t

    É meu amigo Célio, infelizmente avião que voa não é notícia. Mas vc está coberto de razão. Grande abraço.

  2. SERGIO SILVESTRE

    Pois é Heitor,está se informando errado,assista o programa da Jovem Pan com o Augusto Nunes,Fiuza e um tal de Zé Maria que você vai ver que o distanciamento social e os governadores foram os culpados pelas 120 mil mortes por enquanto,que as milicias não existem,que a família Bolsonaro e da Flordelis são o modelo a ser seguido.
    Não reclame de nada,somos os culpados de tudo isso,não soubemos durante todos esses anos de vida,fazer desse rico Pais um lugar onde seu povo tivesse acesso a sua riqueza.
    Somos vendilhões,jogamos pela janela as oportunidades por ódio ou prazer de aniquilar adversários como uma torcida de futebol.
    Muitos da classe media alta e ricos fedem arrogância,temos instituições apodrecidas e passamos pano na corrupção dos nossos preferidos.
    Citando Cicero,lá naqueles tempos já existia a máxima de que a corrupção minha é diferente da sua,e que a lei é apenas um detalhe que serve a gosto pelos amigos ou desafetos,e não vai ser agora ,com um mundo que se diz politicamente correto é que vamos concertar tudo,só tende a piorar.

  3. Luiz Julio Zaruch

    Célio
    Enquanto isso, o capitão – que na verdade era tenente e ganhou o novo status ao reformar-se – vai comendo pelas beiradas. E todo mundo deixando. Não há oposição séria. Foi assim nos anos 1930, na Europa. E deu no que deu. Que Deus nos proteja!!!!

  4. Edson Dallagassa.

    Caro Colunista.
    Já que entramos em terreno erudito me sinto no direito de, também, exercitar o meu Latim de Colégio Estadual.
    Lá vai: “quosque tandem Bolsonaro abutere pacientia mostrar”.

  5. Edson Dallagassa.

    Retificacao.

    “Mostrar “ fica por conta do maldito corretor de texto.
    O correto, evidentemente é “nostrae”.

  6. Frik

    A TV dos novos tempos é o YouTube. Antes eu ouvia horas de rádio, e mais outras horas de TV aberta pra ficar minimamente a par das últimas notícias; hoje basta seguir alguns canais do YouTube para ter o mesmo em alguns minutos e clicadas certeiras nos destaques. Internet não é só pra postar comentários em blogs.

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